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✍️ Daddo Moreira
📅 15/01/2025
🕚 13h20
📷 Capa: Imagem criada por Inteligência Artificial (Bing Create Image)




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Uma ferrovia de pouco mais de 20 quilômetros ligando o Centro da cidade do Rio de Janeiro – a Côrte Imperial na época – à Boa Vista da Tijuca (Alto da Boa Vista), passando ao lado dos Arcos da Lapa em uma ponte de ferro, cruzando o bairro de Santa Teresa e contando com algumas estações, paradas e túneis, sendo um deles sob o Morro do Corcovado e outro sob a Mesa do Imperador… parece um projeto de certa forma sem nexo e chances de ser implementado, certo? E se dissermos que frentes de obras chegaram a ser instaladas e caminhos foram abertos, sendo posteriormente convertidos em ruas, nestes trechos por onde a ferrovia passaria? E, além disso, se dissermos que vestígios foram deixados e ainda podem ser encontrados, principalmente nas matas da Floresta da Tijuca?

Sejam bem vindos a mais um artigo exclusivo do site Trilhos do Rio. Agradecemos a visita e desejamos a todos uma excelente leitura!

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INTRODUÇÃO

Durante muitos anos, diversos projetos ferroviários surgiram e foram implementados. Contudo, em considerável quantidade, outros projetos foram descartados, cancelados antes mesmo de saírem do papel, ou até mesmo iniciados mas não concluídos. Poderíamos citar inúmeros, até porque a cada vez que as pesquisas avançam, mais e mais projetos e propostas são revelados, uns plausíveis mas outros nem tanto. Todavia este não é foco deste texto, mas em breve falaremos mais sobre o assunto.

Algumas propostas foram bem lúcidas e promissoras, mas não saíram do papel, como uma ferrovia contornando a Baía da Guanabara e conectando ferrovias já existentes, as integrando que, contudo, não foi aprovada pelo Império (projeto de Carlos Alberto Morsing, engenheiro que está tendo sua trajetória descrita através de um livro que o autor deste texto está escrevendo); e linhas que chegaram a ter as obras iniciadas, mas interrompidas por diversos motivos. Neste caso podemos citar outra proposta de Morsing: a Estrada de Ferro Botafogo a Angra dos Reis, obra em que o mais conhecido vestígio é a atual Avenida Niemeyer, que foi convertida para estrada de rodagem após a interrupção das obras ferroviárias.

UM POUCO DE HISTÓRIA

Entretanto, uma enigmática e surpreendente obra, tem nos despertado a curiosidade há alguns anos: uma ferrovia (que poderia ser para circulação de trem ou bonde, informação ainda não confirmada) que teria deixado vestígios na atual Floresta da Tijuca, uma ampla área montanhosa da cidade do Rio de Janeiro que, no início do século XIX, após longo período de devastação para uso da madeira e lavouras de cana-de-açúcar e café, teve o reflorestamento ordenado por Dom Pedro II, em 1867.

Esta medida foi motivada também porque a cidade começou a sofrer com a falta de água potável. Este fato, que curiosamente teve o foco mais recentemente, em debates sobre ecologia, aquecimento global e preservação ambiental, é causado pela falta de proteção da vegetação, fazendo os mananciais secarem. Esta missão de reflorestamento foi confiada ao major da polícia militar Archer, em empreitada onde foram plantadas 100.000 mudas em treze anos, principalmente espécies nativas da Mata Atlântica. Posteriormente, o substituto do major Archer, o barão d’Escragnolle, empreendeu um trabalho de paisagismo, transformando a floresta em um belo parque para uso público, com áreas de lazer, fontes e lagos.

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Parque Nacional do Rio de Janeiro foi criado através do Decreto N° 50.932, emitido pelo presidente Jânio Quadros em 6 de julho de 1961, vindo unificar as antigas Florestas Protetoras da União de Tijuca, Paineiras, Corcovado, Pedra da Gávea, Trapicheiro, Andaraí, Três Rios e Covanca, presentes no Maciço da Tijuca, no antigo Estado da Guanabara, em uma única área protegida, de aproximadamente 3.200 ha. O Decreto N° 60.183, também emitido pela Presidência da República, em 8 de fevereiro de 1967, mudou o nome do parque definitivamente para Parque Nacional da Tijuca (PNT)

E A FERROVIA?

Voltando aos projetos ferroviários, alguns foram propostos para a região e chegaram a sair do papel, como a Estrada de Ferro da Tijuca (serviço que ligava o Centro da cidade do Rio de Janeiro aos bairros da Tijuca e, posteriormente, Alto da Boa Vista, utilizando-se inicialmente de veículos de tração animal, depois movidos a vapor por um curto período, e no final com bondes já eletrificados) e o serviço efêmero conhecido como Bonde Sumaré (ligando os bairros de Santa Teresa, na altura do local conhecido como Dois Irmãos, ao Alto da Boa Vista). Além desses, diversos outros projetos foram idealizados mas nem chegaram a ter as obras iniciadas, como linhas ligando o bairro do Grajaú e Andaraí ao Alto da Boa Vista, um serviço turístico circulando na cota de 80 metros de altitude contornando a serra, e linhas com prolongamento para o Jardim Botânico, dentre outros.

Contudo, no começo da década de 2020, uma informação nos chamou muito a atenção: próximo de um ponto turístico bastante conhecido da cidade haveria vestígios de um projeto ferroviário iniciado, mas não concluído. As primeiras informações conhecidas foram publicadas no site do projeto da Trilha TransCarioca, que é a maior trilha urbana de longo curso do Brasil e da América Latina, com cerca de 180 km que atravessam o Rio de Janeiro de leste a oeste, ligando Barra de Guaratiba ao Morro da Urca. Inaugurada em 11 de fevereiro de 2017, ela foi idealizada por Pedro da Cunha e Menezes no ano 2000, inspirada em trilhas de longo curso ao redor do mundo. Reconhecida oficialmente em junho de 2017, é composta por 25 trechos, sendo um marco para ecoturismo e preservação ambiental na cidade.

Imagem: https://trilhatranscarioca.com.br/portao-da-floresta-x-mesa-do-imperador/

Segundo um membro do projeto que tivemos contato, esta ferrovia teria sido proposta no longínquo ano de 1858, apenas 4 anos após a primeira ferrovia do Brasil ser implementada, entre Guia de Pacobaíba e Raiz da Serra, no extinto município de Estrela, atual território de Magé. Apesar de parece algo muito precoce, documentos encontrados posteriormente mostraram que as obras, propostas na região, já eram de períodos próximos a 1858, por isso as pesquisas continuam em andamento sobre o assunto e poderão trazer à tona mais informações no decorrer do tempo.

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A ESTRADA DE FERRO DA CÔRTE À BOA VISTA DA TIJUCA

Após o período tenebroso da pandemia de COVID, e um consequente hiato de atividades de pesquisa que costumávamos organizar, em 2022 realizamos uma das mais emblemáticas expedições da história Trilhos do Rio: a primeira pesquisa Allen Morrison sobre Bondes. Mais detalhes, como a motivação da homenagem ao batizarmos a atividade, o trecho percorrido e as descobertas realizadas, poderão ser vistos no texto abaixo:

1ª Expedição Allen Morrison de Pesquisa sobre Bondes (Santa Teresa — Alto da Boa Vista)

Este trecho, apesar de possuir traçado diferente do projeto que é tema desta matéria, aguçou ainda mais a nossa curiosidade em pesquisar e tentar desvendar mistérios, visto que o link acima – da atividade de pesquisa por onde existiu de fato, mas por poucos anos, uma linha de bondes ligando Santa Teresa ao Alto da Boa Vista – mostra que estávamos no caminho certo, vide a quantidade de resquícios ainda existentes, da passagem dos trilhos pelo trecho, analisados mais de 110 anos depois!

Voltando ao assunto, e voltando um pouco na narrativa, ainda de acordo com o site da trilha TransCarioca citado mais acima, esta linha misteriosa teria um ramal para o Jardim Botânico, o que nos despertou a curiosidade se a Estrada da Vista Chinesa e a Estrada Dona Castorina seriam originalmente vias ferroviárias, hipótese descartada posteriormente. E curiosamente quanto mais procurávamos menos conseguíamos informações sobre o assunto, e o mistério só aumentava. Nunca desistimos, mas o foco se voltou para outras atividades e pesquisas.

Em 2023 este autor percorreu e visitou sozinho o trecho, e ficou surpreso com o que presenciou. No penúltimo dia do ano foi produzido este vídeo abaixo, mostrando a aventura, não recomendável (na ocasião algumas medidas de precaução foram tomadas, como informar aos amigos e familiares sobre a atividade e notificar as autoridades e equipes de socorro caso não fossem dadas notícias até determinado horário).

Até que, já no ano de 2025, durante pesquisas online realizadas por este autor, mas com outro objetivo (informações sobre a Estrada de Ferro da Tijuca, citada anteriormente), ao final da pesquisa surgiram materiais, diversos mapas, mostrando o traçado de uma obra projetada.

Inicialmente seriam imagens mostrando muito detalhadamente as curvas de nível, o arruamento e construções significativas da época, e o percurso do projeto ferroviário saindo do Centro da cidade do Rio de Janeiro. Mas algo estava estranho: a estação inicial seria no Largo da Carioca e teria o nome de “Estação da Guarda Velha”, nome antigo da atual Avenida Treze de Maio. A linha não seguiria no sentido oeste, em direção a Tijuca, mas alcançaria o bairro de Santa Teresa, passando sobre uma ponte de ferro em paralelo aos Arcos da Lapa! Como assim? Que projeto é esse?

Foi aí que, após cair da cadeira, o autor que escreve estas linhas percebeu o que tinha diante de seus olhos, começou a esmiuçar o mapa e se prontificou a realizar sobreposições de imagens, um intrincado e trabalhoso procedimento que tem por objetivo colocar mapas e plantas antigos sobre imagens de satélite recentes, em softwares como o Google Earth, de modo a comparar e traçar o percurso de linhas ou assinalar pontos de interesse, paradas e estações, se utilizando de transparências e posicionamento em coordenadas e pontos de referência para alcançar o objetivo. E, mesmo constatando que as imagens não estavam simetricamente perfeitas, apresentando uma perspectiva complexa que não coincidia totalmente com as imagens aéreas recentes, alcançou um surpreendente resultado, que será exposto a partir de agora, abaixo.

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ANTES DE APRESENTAR O PROJETO

O que será publicado tem a intenção de informar e trazer à tona este projeto oculto e praticamente desconhecido, mas de alguma forma pode também mudar de alguma forma a visão que temos sobre a história de várias localidades, principalmente de Santa Teresa e das comunidades existentes no bairro, assim como dos trechos florestais.

E isso é o que nos intriga muito também, e atiça ainda mais nossa curiosidade pois, normalmente, quando ferrovias tem obras iniciadas ou mesmo concluídas, mas atualmente não existem mais, costumam deixar marcas atestando a sua presença no passado, com raríssimas exceções. Analisando os mapas e imagens de satélite, pode-se constatar que diversas ruas e vias de Santa Teresa parecem ter tido origem a partir do percurso desta obra e – pasmem – trilhas na mata aparentemente correspondem ao traçado do projeto!

Caminho por onde frentes de obras desta ferrovia foram iniciadas na Floresta da Tijuca. Imagem: Daddo Moreira em 2023

Então, muita informação ainda precisará ser pesquisada, inclusive nos locais, para confirmar e registrar possíveis vestígios indicativos da passagem de engenheiros sondando o trecho ou mesmo trabalhadores que tenham iniciado as obras, interrompidas por motivo ainda desconhecido.

Por fim, este tipo de pesquisa em campo é algo que recomendamos ser feito apenas por pessoas habituadas ou preparadas para tais atividades, portanto não tentem algo sozinhos, sem supervisão, contatos, ou mesmo acompanhados por companhias despreparadas, pois sem experiência e cuidados o risco é muito grande!

No Arquivo Nacional, origem deste material (download ao final deste texto), é citado que os trabalhos iniciaram em 1884 e seguiram até o ano de 1891. O mapa é assinado e parece ser de responsabilidade de Domingos Murtinho e Rodolfo Aleandre Hehl e por tem como título “Projecto de uma Estrada de Ferro entre a Corte do Rio de Janeiro e a Boa Vista da Tijuca – Estudos preliminares”. Além das informações assinalando o percurso da linha, no rodapé constam outras informações detalhadas, como onde seriam necessárias obras de terraplanagem ou aterros, para vencer os desníveis, a localização de obras de arte, extensões de túneis, nomes das paradas e estações, enfim, um documento bastante completo.

ATENÇÃO! Os estudos feitos baseados neste material foram feitos diversas vezes e ainda não alcançaram uma margem absoluta de precisão, portanto algumas inconsistências poderão existir.

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Autor

  • Daddo Moreira

    Formado em Arquivologia, pós-graduado em Engenharia Ferroviária, técnico em TI, produtor e editor multimídia, webmaster e webdesigner, pesquisador e historiador informal. Foi presidente e é o atual coordenador-geral Trilhos do Rio.

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