Receba as novidades Trilhos do Rio!

Tempo de leitura:7 minuto(s), 43 segundo(s)

Loading

­
✍️Mozart Rosa
📅 23/10/2020
🕚 12h00
📷 Acervo Benício Guimarães/Trem de Dados

 




───── INÍCIO DA PUBLICIDADE


───── FIM DA PUBLICIDADE




 

Como já mostrado em diversas postagens da AFTR o encerramento de diversos serviços de passageiros, e também de diversos tipos de cargas, nada teve a ver com a intervenção externa. No caso, como as teorias da conspiração sugerem com a intervenção dos empresários de ônibus ou de transporte de cargas, foram decisões internas da RFFSA e os diversos motivos aparecem em várias de nossas postagens.

Um motivo até agora não apresentado por nós, mas bem relevante, se refere às prioridades de transporte. Este é o assunto dessa postagem, que apresentaremos abaixo.

Desejamos a todos uma boa leitura!


Com o passar dos anos, a RFFSA adquiriu um tal gigantismo que era preciso dar um ordenamento coerente ao transporte de seus produtos. Daí foi criada uma tabela de prioridades em função do tipo de carga transportada. Prioridade de passagem significava que as cargas de prioridade menor (em número, mais acima na tabela) tinham prioridade de passagem sobre as de prioridade maior (em número maior). Ou seja, a prioridade n.º1 tinha mais prioridade sobre a de n.º2, a prioridade 2 sobre a 3 e assim por diante.

Trem de transporte de granéis da RFFSA em local e data desconhecidos. Fonte: Acervo Benício Guimarães/Trem de Dados

 

Não é de nosso conhecimento quando essa tabela foi criada e qual a sua totalidade, as informações que prestaremos resultam de conversas com ferroviários aposentados. Esses ferroviários, a partir de lembranças, nos forneceram a tabela abaixo. A certeza que temos é apenas em relação aos itens 1, 2, 3, 6 e o último. Caso alguém a tenha em sua totalidade, por favor nos envie. Desde já agradecemos, obrigado.

Abaixo a tabela:

  1. Carga Viva
  2. Laticínios
  3. Passageiros
  4. Desconhecido
  5. Desconhecido
  6. Combustíveis
  7. Desconhecido
  8. Desconhecido
  9. Graneis Ferrosos

Por Carga Viva, prioridade 1, entendemos Gado; e na última posição da tabela, prioridade 9, temos granéis, no caso Minério de Ferro. Na ocasião, produtos agrícolas e fertilizantes ainda não tinham o peso e a importância que têm hoje. Observem ainda que curiosamente o produto mais lucrativo, nas operações da RFFSA na época, ficava em última posição nas prioridades de transporte.

Trem com vagões de transporte de material inflamável Fonte: Internet

 

E o que isso significava? Para que isso servia? A maioria das ferrovias fora da área urbana e focadas em cargas era normalmente em linha singela, ou seja, apenas uma linha. Diferente do que as pessoas costumam ver nas linhas de subúrbio do Rio, onde temos quatro linhas (e em alguns trechos até seis linhas) em paralelo no trecho Deodoro x Central, e duas linhas nos trechos Deodoro x Japeri e Deodoro x Santa Cruz. Portanto, essa tabela de prioridades era importante para definir quem passaria primeiro por uma linha para chegar primeiro ao seu destino.

VEJA TAMBÉM  A Procter & Gamble e o que ela tem a ver com as ferrovias?
Trem Série 100 passando próximo à Cascadura, no trecho de linhas sêxtuplas da Linha do Centro da EFCB Fonte: Metropolitan Wickers Museum of Science and Industry (via site Estações Ferroviárias).

 

Essa é uma explicação tosca e primária, mas esperamos ajudar a explicar aos leigos e interessados no assunto como funcionava essa escala.

Vagão da Companhia Açucareira Vieira Martins na Usina Santa Florência, em Ponte Nova–MG. Fonte: Magliano Trens e Ferrovias

 

A título de curiosidade, carga viva era prioridade 1 porque o gado depois de muito tempo confinado pode ficar nervoso e destruir com coices os vagões. Era preciso celeridade na entrega, que preferencialmente era feita à noite. Laticínios, normalmente leite, mas também seus derivados, precisavam ser entregues com rapidez para não se deteriorarem. E passageiros tinham compromisso com horário, principalmente. Granéis tinham a última posição por ser algo inerte. Portanto, o produto cujo transporte era o mais lucrativo da RFFSA, ou melhor, o único a dar sempre lucro, tinha na ordem de prioridades a última posição. Perdendo nessas paradas precioso tempo de viagem.

Vagão da Companhia Açucareira Vieira Martins na Usina Santa Florência, em Ponte Nova–MG. Fonte: Internet

Existe disponível no YouTube um documentário sobre ferrovias feito com imagens do Globo Repórter, onde a apresentadora Glória Maria viaja de trem e, curiosamente, mostra uma dessas situações em que um trem de minério espera a passagem de um trem de passageiros.

Cruzamento de trens de carga geral com o de passageiros da Cia. Vale, próximo a Antonio Dias-MG Fonte: Leandro R Barbosa (YouTube)

 

Além da tabela de prioridades, outros motivos embasaram o encerramento do transporte de passageiros e cargas gerais. Na mudança do vapor para o diesel, ao padronizar suas locomotivas em locomotivas de grande porte especificas para granéis, a RFFSA inviabilizou o transporte de todos os outros tipos de carga tirando deles toda a lucratividade. E além da lucratividade, não podemos esquecer a absurda incompetência gerencial que destruiu operações lucrativas como a do trem de Petrópolis, entre outras.

Portanto, a conjunção de vários fatores, que aqui citamos três:

  • A tabela das prioridades;
  • A padronização das locomotivas visando granéis;
  • E a incompetência gerencial da RFFSA;

tirou toda a lucratividade do transporte de todos os outros tipos de carga que não fossem granéis. Mais uma vez o “Estilo EFCB de Ser” se impondo e deixando em segundo plano o “Estilo Leopoldina de Ser”.

Um trem de socorro com guindaste da RFFSA, em data e local desconhecidos (possivelmente na região de Juiz de Fora–MG). Fonte: acervo pessoal Benício Guimarães/Trem de Dados.

 

Ao assumir a presidência da RFFSA, Carlos Aloísio Weber, orientado por adeptos do estilo EFCB continua a dar andamento ao processo de extinção de linhas e produtos “deficitários”, recebidos de antigos diretores.

: : Entenderam os verdadeiros motivos do encerramento de diversas operações de transporte da RFFSA? : :

 

Trem de passageiros da RFFSA, possivelmente o que fazia o trajeto Ribeirão Vermelho x Barra Mansa. Foto: acervo Benício Guimarães/Trem de Dados).

 

Encerramento que acabou, entre outras coisas, com o funcionamento do Matadouro de Santa Cruz e o de Nilópolis, por exemplo, desordenando toda a estrutura logística de fornecimento de carne fresca para diversas cidades. Este assunto já foi tema, inclusive, de uma de nossas postagens. E além do transporte de carga viva, a RFFSA também encerrou as atividades fabris de diversos setores em diversas cidades do interior do Brasil, especificamente de Minas Gerais, ou seja, mais uma vez Minas Gerais sofrendo enorme prejuízo.

VEJA TAMBÉM  Bitola 1600mm? 1000mm? Ou até mesmo a de 760mm?
Trem de carga viva. Fonte: Internet.

Hoje existe uma tabela de prioridades, elaborada pela ABNT, vejam abaixo essa tabela. A ordem prioridade é uma norma técnica, regulamentada hoje pela ANTT. Hoje ela é assim:

Art. 20. Os trens são licenciados de acordo com a seguinte ordem de prioridade:

  1. a) trens de socorro;
  2. b) trens urbanos;
  3. c) trens regulares e facultativos de passageiros;
  4. d) trens especiais de passageiros;
  5. e) trens mistos;
  6. f) trens que conduzam animais;
  7. g) trens que conduzam mercadorias perigosas ou perecíveis;
  8. h) trens de carga em geral;
  9. i) trens de serviço.”
Carro-restaurante de luxo da EFCB (F.Ringhaffer Swichow), um exemplo de trem especial. Fonte: acervo Benício Guimarães/Trem de Dados

 

Um detalhe ignorado por muitas pessoas, em particular os defensores de projetos como o do Barrinha é o item “d”: trens especiais de Passageiros. Observem também o item “g”: Trens de Carga Geral, ou seja, passageiros continuam a ter prioridade sobre carga. No caso do Barrinha o projeto é uma ideia de certa forma inaplicável, pois não se trata apenas de colocar um trem de passageiros no trecho, se trata de colocar no trecho um trem de passageiros com uma quantidade ínfima de passageiros que terá prioridade sobre os trens de carga, o que em caso de problemas com o trem de passageiros colocará em risco o cumprimento de contratos milionários do transporte de granéis. Infelizmente, é a verdade, não há o que se negar.

Trem Barrinha passando por um túnel da Serra do Mar em 1992 Foto: acervo Benício Guimarães/Trem de Dados

 

Além disso, há o fato de a MRS logística já ter deixado claro o total desinteresse em operar este serviço (no caso, o Barrinha), ficando a responsabilidade de operação e manutenção para seus idealizadores, que infelizmente não têm recursos para tal. Não adianta querer impor à concessionária de carga essa operação, seria algo como entrar na casa de um desconhecido e se servir da geladeira sem ser convidado. E o contrato de concessão é bem claro em relação a isso. Caso o contrato seja modificado e se equipare ao que vigora nos trens da Cia. Vale (que opera o trem de passageiros Vitória x Minas), aí é outra história.

Falando nisso: uma modelagem viável do Barrinha, bem como de outros trechos, já foi feita pela AFTR. Mas é um assunto para outra postagem, em breve.

 Gostou? Curtiu? Comente! Compartilhe!
Agradecemos a leitura. Até a próxima!

Feliz
Feliz
33 %
Triste
Triste
0 %
Empolgado
Empolgado
33 %
Sonolento
Sonolento
0 %
Nervoso(a)
Nervoso(a)
0 %
Surpreso
Surpreso
33 %

Autor

  • Mozart Rosa

    Iniciou sua carreira profissional em 1978 trabalhando com um engenheiro que foi estagiário da RFFSA entre 1965 e 1966, que testemunhou o desmonte da E.F. Cantagalo e diversas histórias da Ferrovia de Petrópolis. Se formou Engenheiro Mecânico pela Faculdade Souza Marques em 1992, foi secretário-geral Trilhos do Rio no mandato 2017-2020 e atualmente ocupa o cargo de redator do site, assessor de contatos corporativos e diretor-técnico.

    Ver todos os posts
VEJA TAMBÉM  167 anos de inauguração da Estrada de Ferro Dom Pedro II

Classificação média

5 Star
0%
4 Star
0%
3 Star
0%
2 Star
0%
1 Star
0%

Acesse para Comentar.

Post anterior Projeto Trilhos do Rio II – Ferrovia Centro-Sul Fluminense (2)
Próximo post Aeromóvel, o que é? (Parte 1)