Texto originalmente publicado em 13 de março de 2023*
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Ao longo dos anos, o site Trilhos do Rio publicou mais de 100 artigos sobre a história das ferrovias, além de alguns projetos. Em sua maioria, com informações obtidas a partir de fontes primárias, e neles incluímos relatos de alguns profissionais que vivenciaram o momento.
O tempo nos mostrou que existia uma forte dicotomia entre a informação que publicávamos e o que as pessoas do outro lado já tinham escutado e acreditavam ser verdade. Mas essas pessoas acreditavam em algo sem nenhum embasamento. Não se tratava apenas de desinformação, mas de má informação, informação que muitos tinham e cujas origens eram baseadas apenas em boatos, sem nenhuma base sólida.
Chegamos, então, à conclusão de que era preciso fazer um introito, explicar o que aconteceu e por que determinadas versões predominavam. Essencialmente, prestar informações históricas sobre o princípio das ferrovias, mas também da história do Brasil, cujas histórias se entrelaçam. Informações baseadas em fontes primárias.
Sabemos que poderemos ser criticados, pois algumas dessas informações estão tão entranhadas no imaginário das pessoas que será bem difícil mostrar a nossa versão, ainda que seja com fatos. Mesmo assim, resolvemos escrever este artigo e considerá-lo o número 1. Sim, consideraremos este artigo como o artigo número 1 e será a partir dele que tudo acontece.
Vamos apresentar a existência de três aspectos inerentes à compreensão da história do Brasil e, por conseguinte, da história das ferrovias. São aspectos desconhecidos pela maioria, mas de vital importância para a compreensão do que efetivamente aconteceu na formação do Brasil como nação e da história da formação de nossas ferrovias. Esses aspectos entrelaçam a história das ferrovias com a história do Brasil.
Pretendemos que este texto seja usado na introdução de debates, em vídeos que pretendemos fazer e em futuros textos. Ele será sempre citado, pois esses três aspectos, como sempre, só nós aqui citamos, e muitas dessas informações parece que só nós temos.
Optamos por dividir o texto completo em duas partes, a primeira é a divulgada hoje. E fique atento para a paginação: ao final deste texto existe uma opção de continuar lendo a parte final, para não ficar um texto pesado de se abrir e possibilitar uma melhor navegação e leitura.
Sejam todos bem vindos a mais um artigo exclusivo Trilhos do Rio. Agradecemos a visita e desejamos a todos uma excelente leitura!
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ARTIGO NÚMERO 1
OS TRÊS ASPECTOS DO QUE REALMENTE ACONTECEU COM AS FERROVIAS DO BRASIL
Para entender o que aconteceu com nossas ferrovias, é preciso conhecer e entender os três aspectos que envolvem a história das ferrovias e a história do Brasil. Considerando que a história das ferrovias se confunde com a história do Brasil, é preciso conhecer e entender essa história, a verdadeira história do Brasil, sempre a partir de fontes primárias. Sem entender isso, cai-se na mesmice das informações desencontradas, nas avaliações malfeitas e nas conclusões esdrúxulas.
Detalharemos abaixo, portanto, esses três aspectos:
PRIMEIRO ASPECTO: COMO A HISTÓRIA É ENSINADA
Ferrovias fazem parte da nossa história, portanto, é preciso entender o seguinte: nossa história é atualmente ensinada de quatro maneiras distintas, e isso tem um impacto direto na compreensão do que aconteceu com as ferrovias.
A primeira maneira como a história é ensinada é a maneira criada pelos que proclamaram a República, uma maneira onde o Império e a Família Imperial são instituições menosprezadas. Personagens como Carlos Alberto Morsing, Paulo de Frontin, Cristiano Benedicto Ottoni, ou saindo da área técnica, Ernesto Carneiro Ribeiro, entre outros, que tiveram forte presença na República em seu início, mas por serem oriundos do Império, foram relegados ao esquecimento. Seus feitos, que foram muitos, foram esquecidos.
Mesmo figuras proeminentes do Império, como Antonio Clemente Pinto – o Barão de Nova Friburgo – Joaquim José de Souza Breves ou Francisco Paulo de Almeida, primeiro Barão de Guaraciaba, foram deixadas de lado. No caso do Barão de Guaraciaba, não fica bem para parte dos críticos falar dele. Afinal, ele era negro e dono de escravos.
Um dos casos mais emblemáticos dessa forma parcial de escrever a história e apagar biografias é como os Irmãos Rebouças, Antonio e André, foram e são tratados e lembrados até hoje por alguns, sendo condenados ao ostracismo. Talvez pela amplitude de seus feitos, podem ser considerados os maiores engenheiros da história do Brasil. Contudo, eles foram excluídos da história oficial escrita pelos historiadores desse período, provavelmente por serem grandes amigos da Família Imperial, tendo inclusive um deles se retirado do Brasil com o Imperador, por amizade e gratidão por tudo que a Família Imperial fez por eles.
Para piorar, foram condenados ao ostracismo uma segunda vez pelos historiadores pós-64, afinal eram negros, mas amigos do Imperador, e chegaram aonde chegaram por méritos próprios, algo que não coaduna com as políticas anti meritocracia dos militantes atuais e do “nós contra eles”, afinal, frequentaram a corte e foram amigos dos poderosos da época.
Ainda hoje muitos moradores do Rio de Janeiro não fazem a menor ideia de que o túnel chamado Rebouças, que corta a cidade, ligando a zona norte à zona sul, e que muitos cariocas transitam por ele diariamente, ou pelo menos eventualmente, é uma homenagem aos irmãos, onde cada túnel homenageia um deles. Um túnel se chama André Rebouças e o outro, Antonio Rebouças.
Na realidade, o Período Imperial foi um período riquíssimo de nossa história, ensinado nas escolas de forma incompatível com a grandeza que realmente foi. Sendo as ferrovias partes integrantes desse período, sua história também é ensinada de maneira incorreta. Personagens e fatos importantíssimos são menosprezados.
São unânimes em falar do baile da Ilha Fiscal e falar da opulência dele, mostrando os “absurdos” do Império. Isso é uma técnica ensinada em escolas de jornalismo, isolar um fato por menor que seja e exaltar esse fato, para o bem ou para o mal, aqui nesse caso para o mal, afinal, a partir de uma única festa, quiseram enterrar a imagem da Monarquia. Mas poucos falam do desastre que aconteceu com o “Encouraçado Aquidabã”, muito pior e muito mais trágico que o baile da Ilha Fiscal, e sobre o que aconteceu ali, nada nunca é falado em nenhum livro.
A segunda maneira como a história é ensinada é a forma criada pelo DIP — Departamento de Imprensa e Propaganda, de Getúlio Vargas. Alguns afirmam que Getúlio Vargas criou a indústria de base, pois tínhamos uma indústria incipiente. Interessante notar que aqueles que defendem isso não sabem definir o que é indústria de base ou o que é incipiente. E na maioria das vezes nunca entraram em uma fábrica. Tínhamos uma indústria em crescimento, as ferrovias faziam parte disso, e tudo isso foi varrido para debaixo do tapete.
Essa manipulação de nossa história, que destrói pessoas e biografias, é ruim para a real compreensão dos fatos. E citamos acima apenas alguns personagens. Poderíamos citar muitos outros, mas focaremos em um homem cuja biografia contraria os defensores de Getúlio Vargas e mostraremos o porquê: trata-se de Elói Chaves. Certamente, você nunca ouviu falar dele, mas seus pais e avós devem muito a ele.
Natural de Pindamonhangaba, tornou-se político por Jundiaí, e foi um dos maiores cafeicultores do Brasil. Fundou em 1889 o atualmente finado COMIND — Banco do Comércio e Indústria de São Paulo S.A. Em 1902, cria a Empresa Luz e Força de Jundiaí, em 1910 adquiriu a Companhia Jundiahyana de Tecidos e Cultura S/A, posteriormente rebatizada como Tecelagem São Bento. Em 1912, constituiu a Cia. Ermida de Papel e Celulose. No mesmo ano, tornou-se um dos maiores acionistas da S.A. Central Elétrica Rioclarense. Também adquiriu as Empresas Força e Luz de Mogi Mirim, Empresa Melhoramentos de Mogi-Guaçu e Companhia Luz e Força Jacutinga. Empresas que, segundo os defensores de Getúlio Vargas, não existiam, afinal tínhamos uma indústria “incipiente” antes de Getúlio Vargas.
E por fim, em 1917, seguindo de trem para a então capital do Brasil, o Rio de Janeiro, para uma sessão da Câmara de Deputados — ele era Deputado Federal por São Paulo — e conversando com um ferroviário, ouve falar da Mútua dos empregados da Estrada de Ferro Leopoldina, instituição que tem, no ano em que este artigo foi escrito (2023), mais de 124 anos, sendo a mais antiga instituição de previdência privada do Brasil. A partir dessa conversa, Elói Chaves apresenta projetos que só foram aprovados em 1923, do que viria a ser o INPS. Elói Chaves é atualmente reconhecido como o pai da Previdência Social no Brasil.
Como se pode observar, Getúlio Vargas não foi o responsável pela previdência social no Brasil. Muito antes, Elói Chaves já se preocupava com o assunto.
A terceira forma como a história é ensinada é a forma pós-1964, onde é criada a dicotomia de “nós contra eles”, ricos contra pobres, iniciando a divisão da sociedade que é tão comum atualmente. Isso cria a falácia de que os “poderosos empresários do ônibus” destruíram o setor, mas não se fala sobre os prejuízos milionários e a péssima gestão da RFFSA, entre outras falácias que não têm base na realidade.
Quem introduziu essa deturpação na historiografia brasileira, criando uma narrativa própria, foi o sociólogo Caio Prado, que nem historiador era. Ele importou vários conceitos que nada tinham ou têm a ver com a realidade brasileira — conceitos copiados do contexto saxão — e que até hoje são repetidos, mas que a maioria não sabe a origem. Esse senhor, que era o “esquerda caviar” de sua época, era de família ilustre e rica, nunca precisou trabalhar e, como normalmente acontece, virou marxista.
Esses conceitos que ele criou posteriormente tornaram-se verdades incontestes, afinal foram criados por um famoso da época. Muitas das visões que se tem hoje sobre o passado do Brasil foram criadas por ele. Caio Prado escreveu até mesmo sobre as ferrovias, mas analisou o problema vendo apenas a casca, sem entender as questões estruturais.
Todos os escritos de Caio Prado tinham um enorme viés marxista e, aliado à sua fama, conseguiram fazer algo extremamente prejudicial às gerações futuras: tirar o foco de estudo das pessoas e dos fatos para eventos utópicos. Isso prejudica enormemente o ideário das novas gerações sobre a história do Brasil. Explicando melhor: hoje, ninguém reconhece alguns personagens importantes do passado, mas conhece diversas narrativas contadas sobre eventos passados, narrativas essas bem discutíveis.
A quarta forma como a história é ensinada é considerada a mais próxima da verdade. Nos documentários da empresa “Brasil Paralelo”, personagens menosprezados pelos chamados historiadores oficiais são mostrados, bem como sua importância para a história do Brasil. Os fatos são interpretados à luz de informações primárias, algo que é ignorado por alguns “historiadores”. É por isso que a “Brasil Paralelo” é odiada na maioria das vezes por pessoas que costumam criar sua própria narrativa, muitas vezes não tendo embasamento.
Além disso, a maioria dos professores de história nunca trabalhou em uma fábrica. Eles muitas vezes não consideram o que ela representa para a economia do município, do estado ou do país, e também não consideram que a empresa é uma fonte geradora de emprego e renda para a região. Sendo professores da rede pública, eles sabem que, com ou sem crise, seu salário será pago. E assim pode ocorrer de ensinarem história sob uma perspectiva ideológica, desprezando eventos que não assimilam.
Essa deturpação da história tem provocado reações em alguns professores mais sérios, como o professor Marcelo Andrade, que tem um canal no YouTube onde procura ensinar a história como ela aconteceu, fornecendo fontes primárias.
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