✍️ Mozart Rosa
📅 21/08/2020
🕚 12h00
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Aumentando o prejuízo da RFFSA – A renúncia de faturamento
Nos capítulos anteriores, você soube como a Guerra das Bitolas iniciou-se, e como mais uma vez a RFFSA teve influência nesse acontecimento. Daremos prosseguimento a história neste texto, a parte 4 da série, onde veremos como a operação das linhas em bitola métrica, principalmente da EF Leopoldina, foram propositalmente renegadas e mal administradas de modo a destacar apenas o que traria teoricamente um retorno maior e mais imediato: o transporte de granéis principalmente através das linhas em bitola larga da EFCB.
Desejamos a todos uma boa leitura.
Depois do início apoteótico e trágico, obviamente as coisas só tendiam a piorar. E nessa caravana Holiday em que se transformou a RFFSA tudo era possível. Até mesmo renunciar ao faturamento! Sim, os senhores leram direito: a empresa estatal mastodôntica, cheia de prejuízo por todos os lados, passou deliberadamente a recusar faturamento.
Em um determinado momento da década de 1980, por conta de uma reforma administrativa interna, criou-se a STU-RJ (Superintendência de Transportes Urbanos no Rio de Janeiro) para cuidar dos trens de subúrbio, e a STU-SP em São Paulo com a mesma finalidade. Esse é o caminho lógico em empresas: criar superintendências independentes para determinados produtos é algo usual. Aqui, no caso, foi criada uma superintendência para passageiros de subúrbios, ficando as outras superintendências para cargas.

Acontece que estamos falando da RFFSA e ela não era uma empresa normal. Ao longo das linhas de subúrbio no Rio de Janeiro existiam uma série de empresas que se utilizavam regularmente dos serviços de carga da RFFSA e que, repentinamente, foram avisadas para que procurassem outro transportador, pois aqueles trilhos passariam a operar apenas com passageiros. Alguns exemplos:
Bayer do Brasil: Recebia regularmente vagões cheios de enxofre. Contrato encerrado.



Postes Cavan: Despachava seus postes da fábrica de Belford Roxo por trilhos. Contrato encerrado.
Ishibras: Possuía uma unidade de Caldeiraria em Inhoaíba, com linha própria saindo da estação Benjamim do Monte, onde fabricava peças que enviava regularmente por trem, para o estaleiro no Caju. Contrato encerrado.



EBSE: Essa Caldeiraria, que já foi uma das maiores do Brasil, eventualmente despachava suas peças por ferrovia. Não era com regularidade, mas gerava faturamento. Contrato encerrado.

Matadouro Municipal de Nilópolis: recebia regularmente composições vindas de Santos Dumont-MG com gado para ser abatido. Contrato encerrado.

Todos os outros matadouros servidos por ferrovias, em vários locais do estado: contrato encerrado.

Matadouro de Santa Cruz, que possuía ramal e estação própria. Fonte: Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro.
Transporte de Laticínios: Contratos encerrados.


Fazendas e Usinas de Cana-de-açúcar: contratos encerrados.

Esse é um de vários aspectos que nunca são abordados por alguém, mas sempre abordamos aqui na AFTR: os problemas causados ao setor de açúcar e álcool, com o desmonte da Leopoldina. Pesquise sobre alguma locomotiva a vapor que ainda opera em algum lugar, pesquise toda a sua história. Observará que no histórico dessa locomotiva constará a operação em algum ramal da Leopoldina, ou da EF Sorocabana (São Paulo), e ao final de sua vida útil essa locomotiva operou em alguma usina de açúcar.

Os casos são abundantes, a própria locomotiva recentemente cedida pelo SESC de Grussaí para a Prefeitura de Miguel Pereira teve esse histórico. Durante anos, rodou na Estrada de Ferro Melhoramentos, posteriormente na Estrada de Ferro Leopoldina, e no final foi vendida para a Usina Barcelos em São João da Barra.

Isso era corriqueiro, todas as usinas tinham ramais próprios e plataformas que se ligavam às linhas tronco da Leopoldina. Repetindo: todas as usinas tinham ramais próprios e plataformas que se ligavam às linhas tronco da Leopoldina. Essas locomotivas, que ficavam dentro da área agrícola ou dentro das usinas e tracionavam produtos agrícolas ou produtos acabados, levavam todo esse material para uma linha onde os trens eram depois tracionados por locomotivas da Leopoldina, ou da Sorocabana no caso de São Paulo, para seus devidos destinos. Com o desmantelamento da Leopoldina e da bitola métrica os usineiros precisaram se virar e procurar novas formas de transportar a cana-de-açúcar do campo para as usinas, assim como o produto acabado das usinas para os centros de distribuição, e esse desmantelamento como já mostrado foi feito por questões políticas e econômicas, tendo o faturamento renunciado e um setor prejudicado. Foi a partir daí que se criaram aqueles caminhões-gôndola (também chamado de gaiolas) enormes com até 6 a 8 módulos (às vezes até mais) que, na realidade, mas pareciam trens sobre rodas.

Fazemos questão, agora pela terceira vez, de repetir a frase não para pedir música no Fantástico, mas para efetivamente mostrar que o que houve com o desmonte das linhas de bitola métrica em geral, foi um ato criminoso de lesa-pátria, os que participaram disso deveriam ter sidos todos presos, portanto ressaltamos novamente: todas as usinas tinham ramais próprios e plataformas que se ligavam as linhas tronco da Leopoldina,

Deliberadamente, por questões políticas, destruíram não apenas a Leopoldina, mas vários setores da economia, como o de gado, açúcar e outros que dependiam das ferrovias. Demorou muito para que o empresariado conseguisse fazer as coisas voltarem a funcionar. Leiam nossos textos abaixo o estilo Leopoldina de ser, e entendam o tamanho da lambança, os prejuízos causados ao Brasil:
Além de diversos casos espalhados pelo Brasil e não citados aqui, pois normalmente focamos mais em casos do Rio de Janeiro.
A opção pelo granel e a falta de visão comercial ajudou na destruição do sistema ferroviário como um todo. Leite, gado, frutas e legumes se transportados com locomotivas adequadas, além do lucro do transportador, tem enorme capacidade de fomentar a economia das cidades do interior. Outra informação importante, ferrovia não para com a chuva, a água da chuva é escoada pela brita que sustenta os trilhos. As estradas vicinais na chuva perdem sua função no transporte da produção agrícola, elas ficam interditadas, portanto, o trem é a opção adequada para o transporte de produtos agrícolas.

Essa guerra prejudicou grandemente durante um tempo o abastecimento do Rio de Janeiro. Com o objetivo de, a todo custo, destruir o legado da EFL, se esqueceram que em muitas fazendas por onde passavam suas linhas existiam plataformas para embarque de gado e produtos hortifrutigranjeiros, transporte não tão volumoso nem lucrativo como o de granéis, mas que geravam faturamento substancial. Se o lucro era pequeno, era justamente pela falta de investimento em equipamentos adequados e na reforma das linhas.
Vídeo que demonstra a importância das ferrovias para o transporte de carga viva
Fonte: Canal Trilhos do Rio no Youtube

O encerramento do transporte de carga viva, outro grande erro cometido, foi fatal para a economia de diversas localidades que contavam com o trem para esse transporte. Foi preciso que os produtores, em curtíssimo espaço de tempo, se adaptassem para fazer esse transporte por caminhões.
Não deixem de acompanhar essa sequência, em breve será publicada a quinta e última parte da Guerra das Bitolas. Até a próxima!
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Agradecemos a leitura. Até a próxima!
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