✍️ Mozart Rosa
📅 07/08/2020
🕚 12h00
📷 Pátio de Barão de Mauá. Fonte: Arquivo Nacional BR_RJANRIO_PH_0_FOT (imagem colorizada digitalmente)
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No capítulo anterior e em outras postagens aqui do site da AFTR relatamos que as jazidas de minério de ferro trouxeram sorte e progresso às linhas da EFCB, a tornando a “preferida” dos governantes em matéria de investimentos e modernização, enquanto as linhas em bitola métrica, em particular as da EFL, foram deixadas em segundo plano.

O modelo de transporte exclusivo de granel adotado pela EFCB por conta do transporte de minérios perdura até hoje, em detrimento do modelo misto (carga e passageiros) com cargas gerais adotados pela EFL. Essa mentalidade ajudou a erradicar o transporte de passageiros por trens em todo o Brasil, além do transporte de cargas de maior valor agregado, que por sua vez adotou o transporte rodoviário por ser expulso do trem e pela maior velocidade do modal rodoviário. Sem a modernização do sistema ferroviário, que poderia oferecer melhores condições, as rodovias foram o caminho para o transporte destas cargas.

Fato nunca comentado é que as operações da RFFSA de transporte de passageiros em sua totalidade eram deficitárias, por diversos motivos:
- Pelas gratuidades para funcionários, ex-funcionários e parentes ascendentes e descendentes de funcionários, além de outras categorias profissionais;
- Pelos preços extremamente baixos cobrados pela RFFSA, mais baratos que os cobrados pelos ônibus. Fato lembrado pela maioria das pessoas quando lembra do transporte de passageiros, mas um fato nocivo quando se pensa na reativação do setor que deve ter como objetivo o lucro, tendo em vista que o investimento será do empresariado.
- Pelo uso de locomotivas adequadas para transportar grandes trens de granéis, mas inadequadas para transporte de passageiros pelo seu consumo.
Existe na Internet um vídeo (abaixo) com uma reportagem da Jornalista Gloria Maria, onde ela embarcava em um trem em São Paulo com destino ao Pantanal. Algumas coisas chamam a atenção: uma mulher entrevistada, comentando sobre o baixo custo da passagem do trem comparativamente ao de um ônibus para o mesmo percurso; e um grupo de empresários paulistas indo pescar no Pantanal. E quem pagava essa farra éramos nós, os contribuintes.
Viagem de trem Rio de Janeiro-RJ x Corumbá-MS em 1986
Fonte: Inspetor Ney
Com a criação da RFFSA o grupo oriundo da EFCB foi ganhando mais poder à medida que a exportação de minério de ferro aumentava e a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) se consolidava como grande exportadora de minério. Com o tempo, a RFFSA se tornou não oficialmente o braço logístico da CVRD que usava seu enorme poder político para nomear seus apadrinhados como diretores da RFFSA e mantinha o foco apenas em produtos de seu interesse.
Augusto Trajano de Azevedo Antunes, dono da CAEMI; e Eliezer Batista, presidente e fundador da Vale; eram na prática os donos da RFFSA e quem efetivamente mandavam nela, nomeando diretores e elaborando metas de trabalho.
Provavelmente a pedido desses senhores, a RFFSA começa a elaborar projetos para aumentar a capacidade do transporte de minério de ferro de Minas Gerais para o Rio de Janeiro, que resultou na Ferrovia do Aço. Na ocasião, o setor técnico da RFFSA ainda com a presença de técnicos oriundos da EFL propôs a reforma da linha tronco da antiga E. F. Oeste de Minas, partindo de Barra Mansa, para o interior de Minas Gerais. A proposta foi dizimada por um rolo compressor político, pilotado pelos engenheiros egressos da EFCB. Iniciou-se então a obra da Ferrovia de 1000 dias, que até hoje não está pronta e que depois de 20 anos foi concluída parcialmente por Azevedo Antunes.

Com as privatizações no final da década de 1990 esse mesmo grupo dominante, agora todos reunidos sob o guarda-chuva da Companhia Vale do Rio Doce que absorveu a Caemi, arrematou as concessões das malhas da EFCB e da EFL e manteve o mesmo paradigma do transporte de granel determinando que apenas a MRS trouxesse carga para o porto do Rio abandonando ao léu a rede da Leopoldina e toda a estrutura então existente, inviabilizando assim o acesso ao porto do Rio em bitola métrica. Daí vem a origem de boa parte da motivação que fez a FCA (Ferrovia Centro-Atlântica) ter abandonado as operações no Rio de Janeiro.

Outra maluquice foi a quase paralisação do porto de Niterói, que, por ter acesso apenas por bitola métrica, teve seu acesso ferroviário interrompido sem nenhum protesto da RFFSA em 1974, inviabilizando a operação de um porto extremamente operacional.

Observem que existem espalhados pelo RJ, MG e SP vários clubes, grupos e associações de ex-engenheiros, ex-maquinistas e ex-funcionários da EFCB e da EFL em quantidade bem maior que existem de ex-funcionários da RFFSA. A integração demorou a acontecer. A Associação Mútua Auxiliadora dos Empregados da Estrada de Ferro Leopoldina, a mais antiga instituição de previdência privada do Brasil, até hoje mantém o nome vinculando-a a EFL. Por outro lado, a AENFER, Associação dos Engenheiros Ferroviários, se chamava Associação dos Engenheiros da Estrada de Ferro Central do Brasil. Alguém ainda tem dúvida da divisão?

Com a transformação da RFFSA, não em um elefante branco, mas em um mastodonte branco e não em um cabide de empregos, mas em um armário inteiro, as despesas administrativas explodiram e como sempre a redução dessas despesas nunca passou pela demissão de funcionários e sim pela desmobilização das linhas da empresa. Inicialmente, vários ramais e sub-ramais deficitários da antiga EFCB, dedicados a pequenas cargas e ao transporte misto, foram erradicados por conta da opção pelo granel. Mas, para mostrar mais serviço, os gestores focaram nas linhas da antiga EFL, onde os objetivos, além de mostrar serviço de redução de despesas, era destruir o considerado inimigo. Não apenas extinguindo linhas, mas destruindo-as, removendo trilhos e se acabando com o que pudesse ser eliminado.

Algo parecido com o que o Império Romano fez em Cartago após conquistá-la. Destruição de tudo, a ponto de até hoje não se saber exatamente onde era essa cidade.
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