✍️ Mozart Rosa
📅 16/07/2020
🕚 12h00
📷 Carlos Latuff / Benício Guimarães 2002
───── INÍCIO DA PUBLICIDADE
───── FIM DA PUBLICIDADE
Durante sua existência os balanços mostraram a RFFSA como a empresa de maior prejuízo e de maior patrimônio do Brasil e quem pagou isso fomos nós, a população. Uma análise fria dos números mostra que o déficit da RFFSA em alguns anos chegou a 7% da arrecadação nacional, ou seja, uma coisa monstruosa.

O empresariado da época poderia ter sido convidado a reformar as ferrovias e atualizar empresas construídas no século XIX para as condições de serviço do século XX, mas isso não foi pensado e ali, naquele momento da constituição da RFFSA, é enterrado o então sistema ferroviário nacional, que na realidade nunca existiu, já que nossas ferrovias nunca foram planejadas para serem interligadas.

Ficam aqui algumas perguntas para alguns “especialistas” que fazem críticas impertinentes e desenvolvem teorias mirabolantes:
- Perceberam que as locomotivas a diesel usadas para tracionar trens de carga eram as mesmas usadas para tracionar trens de passageiros?
- Que consequentemente o consumo de diesel para tracionar uma composição com 150 vagões de carga era o mesmo para tracionar os cinco vagões de passageiros do Trem Rio x São Paulo, por exemplo?
- Porque a RFFSA nunca investiu em locomotivas menores e de menor potência, mas suficiente, para tracionar trens de passageiros?
- Por que se usou tão pouco a litorina¹ no transporte Rio x São Paulo?
- Por que não se expandiu o uso da litorina¹ para outras cidades?
- Será que ninguém nunca percebeu que não existem, ou são raríssimas, litorinas¹ de bitola métrica?

¹Litorinas, ou Automotrizes (ou ainda, automotoras) são veículos ferroviários, normalmente únicos, que operam sozinhos (ou no máximo e raramente, com duas ou três unidades acopladas), possuindo duas cabines de comando (uma em cada extremidade) funcionando com motor a diesel ou elétrico, sendo normalmente utilizada para transporte de passageiros.
Falando do empresário do ônibus, ou como alguns dizem a “Bancada do Pneu”, vamos aos fatos. A empresa de ônibus 1001 surgiu em 1968, a Itapemirim em 1953, a Cometa em 1948, a Fetranspor em 1955. Será que alguém acha que essas empresas nesses períodos nascentes, e a Fetranspor como órgão de classe, tinham força política para impedir que os trens funcionassem transportando passageiros?
É possível ter acontecido em algumas localidades pequenas um aspecto pontual, mas da forma como as pessoas repassam essa informação, quase como se fosse ação de uma organização criminosa, chega a ser risível.
Se fosse hoje, com o poder financeiro e político adquirido por esses empresários, tudo bem, mas no período em que essas linhas de transporte de passageiros por ferrovia foram desativadas, isso é de certa forma absurdo, pois essas empresas eram ainda muito pequenas.
Como mostrado aqui, o custo operacional era elevado, mas o tempo gasto na viagem também não ajudava. A ligação Rio x São Paulo por ferrovia podia chegar a 12 horas, Rio x Muriaé também 12 horas, Rio x Campos 8 horas, Barra Mansa x Angra 6 horas, uma vez ou outra pode ser lúdica e até romântico, mas cotidianamente? O transporte rodoviário era mais rápido, mais barato e em alguns casos mais confortáveis. Uma reportagem de jornal da época dizia ser mais rápido ir de avião do Rio para a Europa do que de trem Rio para Muriaé. Basta pesquisar hoje em qualquer site de venda de passagem a oferta de ônibus Rio x São Paulo apenas no período de 23h00min às 01h00min. Só nesse período, são mais de 800 bilhetes ofertados. Alguém em sã consciência pode acreditar que algum empresário perdeu seu tempo para politicamente encerrar um serviço de trens de passageiros Rio x São Paulo que nesse período ofertava em torno de 100 passagens e com duração de viagem maior que os ônibus? Isso sem considerar os outros horários.
Famoso modelo apelidado Flecha Azul da Viação Cometa que fazia, dentre outros itinerários, o trecho Rio de Janeiro x São Paulo, com rapidez e considerável conforto. Comenta-se que na subida da Serra do Mar o possante Motor Scania soltava labaredas, o que ajudou a reforçar a fama da empresa e seu nome.
Quando João Havelange montou as linhas interestaduais da Viação Cometa, e começou a usar os ônibus Flecha Azul, revolucionou esse tipo de transporte no Brasil ao serem um dos primeiros ônibus com suspensão a ar a rodarem em nossas estradas, tinham ar condicionado, rádio, motoristas com quepe e uniforme… na época foi uma revolução. Um tempo de viagem e um conforto que conquistou os passageiros.
Esse costume em apontar culpados que os admiradores do trem têm em relação ao empresariado do ônibus é correto, mas pelos motivos errados. Como visto no caso de João Havelange a população em massa mudou de modal pelas razões já expostas, mas em muitos casos também relatados, principalmente no estado do Espírito Santo, a própria RFFSA, para diminuir seu prejuízo, pediu às nascentes empresas de ônibus que assumissem um serviço que só causava prejuízo a ela, extinguindo posteriormente as linhas ferroviárias. Se dentro da RFFSA, em seus quadros comerciais, existissem pessoas qualificadas e a empresa não fosse estatal, provavelmente se poderia na ocasião estudar formas de servir à população com diminuição do prejuízo. Algo que nunca aconteceu. Um fato evidente é que a empresa na mão do estado brasileiro sempre deu prejuízo. E sabe aquela história que contaram de colocar gente competente na diretoria? Fomos enganados.

A realidade até hoje não assimilada pelos defensores das ferrovias e pelos agentes governamentais que cuidam do setor é que o setor ferroviário no Brasil estagnou no Governo Vargas e no governo Juscelino foi como um avestruz, que enfiou a cabeça na terra e de lá não saiu. Ainda estamos parados no tempo, ainda estamos em 1940, mesmo estando no século XXI. Ainda usamos linhas ferroviárias projetadas e construídas no século XIX, sem grandes modificações, e poucos se aperceberam disso. O setor pode e quer crescer, mas os agentes governamentais não fazem a menor ideia de como fomentar isso, e atrapalham o empresariado quando estes levam suas propostas. Os governantes são totalmente despreparados. Desenvolver o setor pode ajudar o Brasil a crescer como no século XIX.
O brasileiro tem certa dificuldade em entender a importância do empresário. Acontece constantemente também algo que parece certa inveja do sucesso alheio: recentemente em um fórum sobre transportes o nome de sócios de empresas de ônibus eram citados com enorme raiva e despeito, como se ser dono de empresa de ônibus ou empresário em geral fosse crime. Isso não ajuda em nada o retorno da ferrovia, ou mesmo o desenvolvimento do país. É preciso atrair empresários para o setor, o negócio dando lucro eles investem.

Em todos os grupos de preservação ferroviária, se postam fotos reclamando do abandono, onde a temática é a mesma: “O Governo”, “O Governo”, “O Governo”… nenhum grupo leva o debate para outro nível: o que fazer para o empresário ajudar? Enquanto a temática for essa de reclamar do governo e criminalizar o empresário, continuará sendo perda de tempo. A maioria que critica o empresariado nunca na vida foi dono de uma simples quitanda para entender a dinâmica de um negócio, e ferrovia, na verdade, é muito isso: um negócio. Vamos tentar para de ser ingênuos, o governo não vai fazer nada por completo, poderá no máximo construir para o empresariado administrar. Vamos parar de criticar o empresariado também, existe muita coisa de errada, mas também há gente séria querendo investir, administrar e lucrar oferecendo serviços em transporte, mesmo em ambiente inóspito como é o país. Para quem duvida, tente montar um negócio para ver as dificuldades que o Brasil cria para quem quer empreender. A luta para retomar o setor deve ser a parceria com o empresariado. Simples assim. Nós da AFTR lutamos pelo apoio e parceria do empresariado para — com alguma ajuda que, e se, for necessária do governo — empreender e trazer o estado do Rio de Janeiro e o país de volta aos trilhos.
Gostou? Curtiu? Comente! Compartilhe!
Agradecemos a leitura. Até a próxima!
Classificação média