✍️ Mozart Rosa, contribuição de Thales Veiga
📅 09/07/2020
🕚 16h39
📷 Folha de São Paulo
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Estudar e compreender a História das Ferrovias é por vezes uma tarefa inglória. Informações manipuladas, deturpadas, mal interpretadas, interpretadas de forma ideológica e/ou tendenciosa… essa é a realidade do estudo da História do Brasil e da História das Ferrovias. Um desses grandes erros é chamar os empresários, principalmente os paulistas que construíram as ferrovias, de Barões do Café. O mais correto e adequado seria chamarmos esses homens de Barões das Ferrovias.
O café é uma cultura em que de seu plantio a sua colheita leva-se um período de vinte e quatro meses.
Esse detalhe é desconsiderado ou desconhecido por grande parte dos historiadores.
Quem seria insano a ponto de construir uma ferrovia para transportar apenas café?

As ferrovias começam no Brasil em 1854 com a construção da “Imperial Companhia de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro de Petrópolis”, mais conhecida por Estrada de Ferro Mauá. Irineu Evangelista de Souza, o Barão e Visconde de Mauá, não construiu essa ferrovia como muitos professores de história dizem: “para o Imperador e a Côrte poderem subir a serra no calor”.

Petrópolis era um grande entreposto comercial e, além da família Imperial e diversos outros nobres que possuíam chácaras na região, tinha produção agrícola em seus arredores. Mauá construiu sua Estrada de Ferro para transportar cargas e passageiros e assim ganhar dinheiro. Criou-se ali um padrão operacional de transporte misto de cargas e passageiros copiado por todos, inclusive posteriormente pela Leopoldina, e que durou mais de 80 anos.

Notícias corriam rápido, mesmo naquela época. Quando o nascente empresariado brasileiro, na ocasião composto essencialmente de fazendeiros, começa a ouvir falar da implantação da Estrada de Mauá e dos lucros elevados que ele estava tendo, imediatamente criou-se, entre a elite econômica, um alvoroço e um interesse incomum no assunto. Todos passaram a querer ter a sua ferrovia.

Mauá tinha uma Casa Bancária em Santos. Quando fala para seus clientes, em sua maioria fazendeiros do sucesso, de sua ferrovia no Rio de Janeiro, despertou a partir dali interesse em construírem ferrovias desbravando o interior paulista. Os interesses eram cargas gerais e passageiros. E o café. O café não foi o motivo principal, fazia parte dos interesses e carga a ser transportada.

Isso ajudou a desenvolver o interior de São Paulo. A ferrovia possibilitou levar para o interior espelhos, vidros, banheiras e outros itens impossíveis de serem transportados por tropeiros ou carruagens. Isso mudou toda a dinâmica de ocupação do interior paulista. Esse tipo de mimo possibilitou ao fazendeiro levar esposa e filhos para morarem nas fazendas. Deu conforto a seus familiares. A dinâmica de ocupação e desenvolvimento do interior paulista mudou completamente de um puro extrativismo para local de moradia, desenvolvendo assim as cidades.

Presidente Prudente, Jundiaí, Araraquara, Bauru, só para citar algumas cidades, cresceram e se desenvolveram graças às ferrovias. O mesmo aconteceu no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, onde as cidades cortadas pelas ferrovias se desenvolveram mais que as outras que não tiveram esse privilégio.
Deveríamos chamar esses homens de Barões das Ferrovias, e não de Barões do Café.
A partir daí, de forma atabalhoada, a construção da malha ferroviária nacional começa a tomar forma, mas sempre com a participação intensiva do empresariado via emissão de títulos.
Pedro II é subestimado pela nossa historiografia oficial, mas foi um homem de extrema visão, ao enxergar na ferrovia um grande fator de integração e desenvolvimento nacional e criou mecanismos de incentivo à construção de ferrovias. Vários grupos então se uniram para essa construção, lamentavelmente nem todos com capacidade técnica, gerencial e visão de negócio. Isso resultou em várias estradas de ferro com grandes erros de projeto, traçados sinuosos e problemas técnicos e financeiros. Algumas dessas ferrovias faliram já no nascedouro. A Estrada de Ferro Maricá, hoje cantada em prosa e verso pelos saudosistas, foi um exemplo de estrada mal construída. A E.F. Oeste de Minas é outro exemplo: como comentado por muitos, foi uma lambança generalizada. Salvam-se algumas, entretanto, entre elas a Mogiana e a Paulista. Na realidade, a maioria das ferrovias paulistas tem um histórico de eficiência.
Esse fato explica a enorme quantidade de fusões, aquisições e incorporações no setor ferroviário no decorrer dos anos.

Nem tudo foi um desastre, porém. Eficiência na construção existiu, sim, sempre associada a nomes como os Irmãos Rebouças, Feliciano de Aguiar, Paulo de Frontin, que foi um verdadeiro gênio, Carlos Morsing que foi outro engenheiro brilhante, dentre outros. Com o passar dos anos, vários problemas aconteceram e algumas ferrovias que fracassaram foram encampadas pelo estado. A antiga EFCB pode ser considerada nossa primeira estatal, ao ser encampada pela Coroa devido a problemas financeiros, pois a subida da serra consumiu todo o seu capital, uma obra de vanguarda na época feita por um de nossos grandes engenheiros: Cristiano Ottoni.

Na época, em muitos trechos, o pensamento era guiado por visões de futuro limitadas. Aquele túnel a ser perfurado ou aquela ponte a ser construída, que permitiriam velocidades mais elevadas e tempos de percurso menores, dificilmente eram construídos, sendo descartados.
Construir ponte, furar túnel? Para quê? Contorna o morro.
Velocidades maiores? Para quê? “Muito vento faz mal às pessoas, elas não vão se adaptar”, dizia o proprietário de ferrovia da época (pesquisem jornais daquela época).
Menor tempo de viagem para quê? Para que a pressa?
Isso gerava, entre outras coisas, velocidades médias baixíssimas para hoje, mas satisfatórias para a época.
E quando uma situação tem possibilidade de piorar, acreditem, sempre piora. Havia várias bitolas que não se comunicavam: 1,60 m, 1,10 m, 1,00 m, 0,76 m. Essa última ainda subsiste como trem de turismo em Ouro Preto, operada pela Vale do Rio Doce.
A Estrada de Ferro Rio-Minas, em bitola de 1,00 m, parou em Cruzeiro–SP nunca chegando ao Rio de Janeiro e sem a possibilidade futura de se conectar com a Estrada de Ferro Central do Brasil, em bitola de 1,60 m. É preciso entender isso, pois essas ferrovias, mesmo construídas de qualquer jeito, foram na ocasião fundamentais para o desenvolvimento do Brasil.

Pelo seu aspecto monopolista, construir ferrovia naquele período foi provavelmente o negócio mais lucrativo da história do Brasil, pois investia pela certeza do retorno sem nenhuma preocupação com eficiência. Durante o período em que reinou sozinha, a ferrovia fez fortunas. Todos queriam ter a sua.
Mesmo com todos os problemas, as ferrovias foram fundamentais e fator indutor no desenvolvimento do Brasil, principalmente nos três estados da região sudeste onde mais prosperaram: Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Desbravaram o interior, sendo responsáveis pela consolidação de muitas localidades, que com a queda das ferrovias decaíram também. Santa Maria Madalena, Leitão da Cunha, Casimiro de Abreu entre outras.

É imenso o número de cidades principalmente no Interior do Rio de Janeiro de Minas Gerais que decaíram com a extinção do trem e que até hoje não se recuperaram. As cidades e localidades citadas acima são apenas algumas.
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