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A KODAK, A CÂMERA DIGITAL, E O QUE AS FERROVIAS TEM A VER COM ISSO?

 




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É muito raso o debate sobre o fim e a decadência das ferrovias no Brasil, pois geralmente as pessoas se baseiam em lendas e consideram essas lendas como verdadeiras. Nosso trabalho tem sido o de desmistificar tais lendas.

Entender o que aconteceu com a Kodak e com as câmeras digitais pode explicar o que aconteceu com as ferrovias, uma analogia histórica bem interessante.

Bem vindos e bem vindas a mais um artigo exclusivo do site Trilhos do Rio.
Agradecemos a visita e desejamos a todos uma excelente leitura até o final, informações bônus os esperam!

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O início do filme fotográfico e sua popularização.

O filme fotográfico em rolo foi inventado em 1885 pelo empresário George Eastman, fundador da Kodak. George Eastman não criou a fotografia, mas com o filme no formato que criou, criou uma forma de popularizar a fotografia. Inicialmente em rolos, posteriormente em cartuchos, George Eastman fez com que cada casa pudesse ter uma câmera fotográfica, da mais simples à mais complexa, ele teria o filme adequado a cada uma delas.

Em 1888, Eastman funda a Kodak, que foi durante muitos anos líder na produção de filmes, máquinas de revelar, insumos para tais máquinas e tudo o que se referia ao ato de fotografar. A Kodak popularizou efetivamente a fotografia.

George Eastman

A Kodak foi uma das maiores empresas do mundo, seria o que é hoje a Microsoft em tamanho e em poder.

Imagem: divulgação

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E eis que surge a Máquina Digital.

Em 1975, um engenheiro da Kodak, chamado Steve Sasson, criou aquela que se pode chamar de a primeira câmera fotográfica digital do mundo. Os executivos da Kodak ignoraram aquela nova tecnologia, afinal os enormes lucros da Kodak vinham da venda de filmes e não de câmeras, nenhum deles vislumbrou a possibilidade de que aquele novo meio de tirar fotos pudesse desbancar o sistema até então vigente de filmes de rolo, e resolveram não investir naquele novo produto.

Steve Sasson

Mas gente como Akio Morita, fundador e presidente da Sony, viu ali um novo filão a ser explorado e começou a desenvolver e fabricar câmeras digitais e as aperfeiçoar. Em 1981, a Sony lança a primeira máquina digital do mercado, a Mavica, que custava a exorbitância de US$ 12 mil. Mas foi um início promissor, com a Sony oferecendo diversas novidades desenvolvidas por ela, como, por exemplo, disquetes de 2 polegadas (aprox. 5 cm). Com o tempo, seus preços caíram e elas se popularizaram, tendo sido a Sony uma das maiores vendedoras de câmeras digitais do mundo.

Akio Morita.

Hoje em dia, as câmeras profissionais da Sony, as Cybershort, e as da Canon, as EOS, se desenvolveram e são muito usadas e apreciadas por fotógrafos profissionais de todo o mundo pelas suas extremas qualidades.

E seguindo a Sony, as maiores fabricantes de câmeras do Japão, como Nikon, Canon, Olympus, Pentak, Ricoh, Yashica, Fujiflm, todas lançam suas respectivas câmeras, cada uma melhor e mais barata que a outra, e o resultado é que, de uma hora para outra, o mercado de venda de filmes da Kodak desaparece. Lojas de revelação e venda de filmes, tudo lentamente vai desaparecendo.

A rede DePlá do Rio chegou a ter mais de 250 lojas, para venda e revelação de fotos. Praticamente todas fecharam, e as poucas que resistiram até realizam revelações de filmes fotográficos, mas a maioria dos serviços é de impressão digital.

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Até então líder mundial no setor de fotografia, a Kodak começa a decair, a empresa confiou demais no seu potencial e acreditou que nunca entraria em uma crise, desconsiderando o risco da expansão da concorrência no mercado. Com isso, os japoneses dominaram o setor e ultrapassaram a Kodak.

Empresas alemãs, tradicionais fabricantes de máquinas fotográficas, como Agfa, Leidolf, Rollei, Voigtländer, Leica, se renderam à tecnologia japonesa e lançam suas próprias máquinas digitais.

Embora a Kodak tenha criado a primeira câmera fotográfica digital, a empresa preferiu continuar a apostar no mercado de fotografia analógica. Apenas em 2003 decidiu entrar com mais força no setor digital, mais de 10 anos depois da Sony, contudo, nesse momento as empresas japonesas já dominavam totalmente o mercado.

Essa demora para ingressar no setor digital levou praticamente a companhia, outrora bilionária, à ruína. Como grande parte das receitas da Kodak era proveniente da fabricação e venda de filmes fotográficos, a expansão das câmeras digitais, que ela mesma havia inventado em 1975 e abandonou, causou súbita redução na demanda por tais filmes, afetando significativamente o faturamento da empresa.

Para piorar a situação da Kodak em 1999, a japonesa Kyocera lançou o primeiro celular com câmera. A partir dali, todos os celulares lentamente passaram a ter câmera e as receitas da Kodak com venda de filme minguaram de uma forma assustadora.

A outrora grande empresa quase quebrou, passou por um processo de recuperação judicial e hoje, apesar de ainda existir, não é nem sombra da empresa que um dia foi no passado.

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E as ferrovias? O que tem a ver com tudo isso?

Vamos explicar, mas antes vamos conhecer um acadêmico de Harvard chamado Michael Porter.

Michael Porter

Michel Porter é um acadêmico de Harvard que desenvolveu as chamadas 5 forças competitivas usadas para se fazer o planejamento estratégico das empresas.

Segundo ele, as empresas mais competitivas são aquelas que têm maior capacidade de obter lucro. E a lucratividade pode ser conseguida em função de cinco forças competitivas:

  1. Clientes ou compradores.
  2. Fornecedores
  3. Produtos ou serviços substitutos.
  4. Atuais competidores.
  5. Novos entrantes.

Nosso objetivo aqui é falar de ferrovias, por isso não analisaremos os outros tópicos, nos fixaremos no item 5, os “Novos Entrantes”.

Os “Novos Entrantes” são competidores que querem se estabelecer em um mercado ao qual anteriormente não pertenciam. Não se trata de produtos ou serviços substitutos, mas de outras empresas que pretendem fornecer os mesmos produtos ou serviços das marcas já estabelecidas no mercado, ou produtos alternativos que apresentarão os mesmos resultados.

Assim foi com os produtos digitais tripudiados inicialmente pela Kodak e que causou a sua ruína.

Assim, foram com as empresas rodoviárias de carga e passageiros que começaram a oferecer um serviço melhor do que o oferecido pela EFCB, e posteriormente pela RFFSA.

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E finalmente chegamos as ferrovias

G. K. Chesterton

É comum em diversos grupos existentes sobre ferrovias, pessoas louvando a RFFSA. Na realidade, muitas dessas pessoas são pessoas na faixa de 30 anos que nunca efetivamente andaram nos trens de passageiros da RFFSA e certamente nunca despacharam cargas por essa empresa. Ou pessoas com mais de 40, 50 ou até 60 anos que, quando jovens, andaram de trem sozinhos ou com seus pais, mas nem lembram da realidade existente nos trens, como limpeza, estado de conservação ou a demora em chegar ao destino e a impontualidade.

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Como disse Chesterton, a tradição é muito forte, essas pessoas sonham com algo que nunca viveram. Nunca viveram a demora em chegar atrasados aos lugares, nunca viveram a realidade dos trens sujos, quebrados e com manutenção precária, ou enviaram cargas que nunca chegavam no tempo contratado.

A EFCB e posteriormente a RFFSA com seu nefasto monopólio, tinha a liderança e a exclusividade do transporte de cargas e passageiros no Brasil. Com o advento da aviação, das rodovias e das novas empresas rodoviárias, de carga e de passageiros, os “Novos Entrantes”, seu castelinho de cartas ruiu.

A RFFSA nada fazia ou fez para cativar seus clientes, e seus clientes apenas deram as costas a ela. Simples assim, é preciso desenhar?

Nunca houve um grupo que conspirou nas sombras para a erradicação da RFFSA, isso é bonito e glamouroso de mostrar nos filmes, ou em conversas, mas, na prática, no mundo real, isso nunca aconteceu. A Teoria da Conspiração é bonita para se contar no almoço de família ou para os amigos para dar impressão de que, quem a conta, conhece do assunto.

Mostramos o que acontece quando uma empresa líder de seu mercado ignora novas ideias. Ao ignorar a câmera digital, a Kodak que a inventou, deixou que novas empresas entrassem em seu mercado, os “novos entrantes”, e isso fez a Kodak ter um futuro inglório. De uma então megaempresa, se transformou em uma sombra do que já foi.

A RFFSA ciosa de seu monopólio e prestando serviços medíocres não existe mais, acabou por isso, pela própria incompetência, é preciso que todos compreendam o que aconteceu, e que entendam também que novas empresas podem se interessar pelo legado da RFFSA, mas para isso é preciso não fantasiar e não criar Teorias da Conspiração sobre o que aconteceu, e entender também o quanto, a participação e a intromissão do estado foi perniciosa em tudo isso.

A RFFSA, de uma empresa de transportes ferroviários se transformou em uma gigantesca administradora de imóveis, e uma gigantesca administradora de pessoal, sem dinheiro para investir na reforma e na modernização de linhas, preocupada apenas em ser um bom cabide de empregos, ela simplesmente extinguiu diversas linhas, essa extinção nada tem a ver como muitos acreditam com os empresários do ônibus, eles apenas entraram no vácuo que a própria RFFSA promoveu.

A RFFSA não quebrou antes por ser uma estatal, mas pelos prejuízos que dava e que nós contribuintes pagávamos, já foi tarde, se fosse uma empresa privada teria quebrado há muito mais tempo. Mas ninguém entre esses divulgadores de teorias ridículas entende isso ou leu os balanços da RFFSA.

Ao exaltar a memória da RFFSA sem nunca ter lido seus balanços ou entender o que efetivamente foi a RFFSA essas pessoas estão prestando um desserviço ao setor e ao país.

Leiam os Balanços.

Leiam os Balanços.

Leiam os Balanços.

Leiam os Balanços.

Leiam os Balanços.

E praticamente ninguém lê.

Nosso texto sobre balanços, explicando o que são:

O que é um Balanço Patrimonial?

A divulgação desenfreada dessas teorias bobas e infantis faz com que, quem trabalha em instituições públicas e acredita nessas teorias, rejeite o contato e a participação de empresários do setor rodoviário de carga e passageiros, em novos projetos, e são eles hoje os que sabem transportar cargas, transportar pessoas e têm dinheiro para investir.

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Abaixo, postagens da AFTR sobre as teorias da conspiração que não passam disso, TEORIAS SEM NENHUM EMBASAMENTO.

Artigo 3: as Teorias da Conspiração e ideias sem sentido (parte 1)

Artigo 3: as Teorias da Conspiração e ideias sem sentido (parte 2)

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Nosso homenageado de hoje, Michel Porter

Para os interessados em conhecer Michael Porter:

https://www.hbs.edu/faculty/Pages/profile.aspx?facId=6532

Para os interessados em conhecer as teorias de Michel Porter:

https://www.heflo.com/pt-br/planejameto-estrategico/barreiras-de-entrada/#:~:text=Novos%20entrantes%20s%C3%A3o%20competidores%20que,j%C3%A1%20est%C3%A3o%20estabelecidas%20no%20mercado.

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Bônus para aquele “amante raiz” das ferrovias.

A história da Baldwin Locomotive Works

A Baldwin fundada em 1825, foi uma das primeiras e se tornou uma das maiores fábricas de locomotivas a vapor que existiu. Produziu talvez ¼ das locomotivas a vapor mundo afora, muitas chegaram ao Brasil.

Baldwin 2-8-0.

Em uma época em que a tração a diesel estava engatinhando, a Baldwin não acreditava que esse tipo de tração tinha futuro para locomotivas. Resultado: vieram a EMD e a GE correndo por fora e a Baldwin quando tentou correr atrás do prejuízo, já era tarde. Mais uma empresa que desprezou os “novos entrantes” e as novas tecnologias. E como sempre acontece nesses casos, virou história, suas concorrentes dominaram o mercado.

Matias W. Baldwin, fundador da empresa.
Primeira locomotiva fabricada pela Baldwin em 1832.

Interessados em conhecer melhor a história da Baldwin abaixo a página da Wikipedia.

https://en.wikipedia.org/wiki/Baldwin_Locomotive_Works

 

Obrigado aos que chegaram até aqui.
Até o próximo artigo!

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Com informações de Mozart Rosa
Texto escrito em 9 de setembro de 2024 às 21h01
Última atualização em 1 de dezembro de 2024 às 22h36
Imagem de capa: Locomotiva ALCO RS-1 EK 9 no Kodak Park. Foto de R. Craig*

 

*A história desta locomotiva que consta na capa deste artigo é interessante e vale ser contada: ela foi construída originalmente para a Chicago & Western Indiana em fevereiro de 1950 com o No. 260. A C&WI era a ferrovia terminal da Dearborn Station em Chicago, e este terminal atendia várias ferrovias, incluindo a Erie Railroad e a Santa Fe. Em 1971, a unidade foi comprada pela Genesee & Wyoming Railroad, que rapidamente a revendeu para a Eastman Kodak Company. A EK 9 foi comprada pela Eastman Kodak Company em 1971 e foi entregue à Kodak Park Railroad em novembro daquele ano para atender à ampla unidade de fabricação de filmes e câmeras em Rochester. Depois de atender à ferrovia industrial por mais de 25 anos, o museu teve a sorte de obter uma segunda doação de uma locomotiva histórica da Eastman Kodak Company. Em 14 de outubro de 1997, a locomotiva foi doada ao museu pela Kodak em uma cerimônia oficial no museu, se juntando à antiga Eastman Kodak Company GE de 80 toneladas nº 6, que serviu como a espinha dorsal da frota a diesel do museu por mais de 20 anos.

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Autor

  • Mozart Rosa

    Iniciou sua carreira profissional em 1978 trabalhando com um engenheiro que foi estagiário da RFFSA entre 1965 e 1966, que testemunhou o desmonte da E.F. Cantagalo e diversas histórias da Ferrovia de Petrópolis. Se formou Engenheiro Mecânico pela Faculdade Souza Marques em 1992, foi secretário-geral Trilhos do Rio no mandato 2017-2020 e atualmente ocupa o cargo de redator do site, assessor de contatos corporativos e diretor-técnico.

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