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✍️ Mozart Rosa
📅 09/06/2020
🕚 12h00
📷 Minha vida é um blog aberto




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Devemos peneirar ou não as gemas antes de fazer um bolo para não deixar cheiro ou gosto?

Bitola métrica ou larga, o que é ”melhor”?

 

Ovos? Bitola? O que uma coisa tem a ver com a outra?

Essa página é sobre ferrovias ou sobre culinária?

Fonte: Pinterest

Quando uma ideia, por mais estúpida e sem embasamento que possa ser, cria raízes no imaginário de uma população ou em um grupo, mesmo que haja muitos argumentos racionais mostrando sua inviabilidade, esses argumentos nunca são considerados. Normalmente, tais ideias foram implantadas no inconsciente dessas pessoas a partir de alegações emocionais ou culturais, mas sempre irracionais. Portanto, não se deve esperar racionalidade daqueles que defendem ideias irracionais, muitas vezes inexequíveis.

Argumentos em defesa de tais ideias são procurados no fundo do baú, e as informações para embasar tais argumentos (quando inexistem, ainda são criados) são defesas apaixonadas e cheias de emoção, como se a vida de quem defendesse tais ideias dependesse disso. Por isso fizemos essa postagem, mostrando dois casos extremos, provando que por trás de defesas apaixonadas existem alegações sem solidez, que não se sustentam a partir de análises mais criteriosas.

Bitola Larga é “melhor”. Ok, então vamos lá … quais são os fatores que levam a crer nisso?

  1. Maior capacidade de carga.

Defina em números o que é maior? A Estrada de Ferro Vitória x Minas é métrica, várias ferrovias sul-africanas, que carregam mais até do que a Estrada de Ferro Vitória x Minas, também operam em bitola métrica.

A Sishen–Saldanha Railway Line, na África do Sul, é uma ferrovia onde circulam os maiores trens do mundo, com mais de 340 vagões.

E em bitola métrica.

Quer uma ferrovia com maior capacidade de carga? Então, utilize a bitola de 2,14m, criada por Isambard Kingdom Brunel no século XIX, com capacidade de carga muito maior do que a bitola de 1,60m, mas descontinuada pelos seguintes fatores:

  • Incompatibilidade com as demais malhas ferroviárias;
  • Custo dos dormentes maiores, pela maior largura;
  • Custo de brita maior, pela maior quantidade utilizada;
  • Custo global de construção maior por conta disso.

Esses parâmetros comparativos entre a bitola hoje chamada de Standard de 1,435m e a de Kingdom Brunel, provocando sua descontinuidade, se refletem na comparação de custo Larga e Métrica.

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A Inglaterra teve a sua bitola larga com 2,14m e sua bitola estreita com 1,435m, já tinham pensado nisso. E lá, diferente daqui a bitola estreita prevaleceu.

Trem da Great Western, ferrovia idealizada por Kingdom Brunel Fonte: IkBrunel.org.uk

 

O custo de construção dos trechos em Bitola Métrica é menor que em Bitola Larga, esse fato não se discute. Mas é algo que foi, por conta de defesas irracionais, desconsiderado.

Mais algum argumento para defender a bitola larga e criticar a bitola métrica? Ok, paramos no primeiro.

A disputa Métrica x Larga não surgiu a partir de argumentos racionais, e sim a partir de disputas políticas. E o grupo vencedor defensor da Larga prevaleceu. Ninguém pensou nos raios de curvatura menores da métrica, que facilitariam a abertura e manutenção de vários trechos? Esse pessoal desconhece a frase “O bom não pode ser inimigo do ótimo”.

Trem da EF Cantagalo (encampada pela EF Leopoldina) na Serra do Mar, na região de Nova Friburgo.

 

Na queda de braço pela disputa de poder existente dentro da RFFSA, envolvendo egressos da E.F.C.B. (Estrada de Ferro Central do Brasil) e egressos da E.F. Leopoldina. (Estrada de Ferro Leopoldina), foram vitoriosos os egressos da primeira, que representavam dentro da empresa quem gerava mais faturamento.

Afinal, por pura sorte, as primeiras minas de minério de ferro, exploradas pela Companhia Vale do Rio Doce, ficavam próximas a linhas de bitola larga oriundas da E.F.C.B., o que fez um enorme bem para uma empresa já bem deficitária. Ao ganhar essa disputa, impuseram à empresa e ao sistema ferroviário brasileiro várias coisas, como o padrão de bitola larga e a eletrificação de linhas.

Trem de subúrbios da EF Leopoldina trafegando apinhado de passageiros passando próximo à Mangueira. Fonte: Arquivo Nacional.

Chegaram a ponto de, com o poder político adquirido, conseguir aprovar uma lei na década de 1960 obrigando que novos projetos ferroviários deveriam ser todos em bitola larga. Transformaram uma questão eminentemente técnica em questão política. Não foram feitos estudos fidedignos que confirmassem essa opção, tudo sempre teve origem política travestida de técnica. A partir disso, criaram-se estudos para fundamentar a decisão tomada. Algo bem comum ontem, hoje, sempre. Alguns estudos “científicos” antigos e atuais estão aí para confirmar.

  • Os ovos, título de nossa postagem, faziam mal. Hoje não fazem mais;
  • A Cloroquina funcionava contra a COVID-19, depois não funcionava, depois voltou a funcionar e até o momento não se sabe a verdade;
  • O uso de máscara funciona, depois não funciona mais. E por aí vai … os exemplos são vários!

Isso sem falar no passado dos estudos “científicos” que deram base à eugenia nazista, entre outras baboseiras. Isso se espalhou pelo Brasil, especialmente em São Paulo, onde várias ferrovias tiveram a bitola alargada. Fazer isso em São Paulo, apesar de dispendioso, até foi viável. Mas e em um estado montanhoso como Minas Gerais? O problema é que essa conta não foi paga por acionistas, mas por nós, povo brasileiro. E a conta foi bem alta. Um exemplo disso foram as obras da Ferrovia do Aço.

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A quantidade de pontes e viadutos construídos (109), além dos túneis abertos (81) para viabilizar a construção dessa ferrovia, chega a ser surreal. Sem falar da fortuna gasta em materiais para a eletrificação de via, hoje totalmente sucateada por não ser implementada. Ao optar pelo uso da bitola larga na construção da Ferrovia do Aço, passando por um estado montanhoso como Minas Gerais, foi preciso uma quantidade tão absurda de túneis que o orçamento inicial virou peça de ficção, ajudando a gerar um déficit no Governo Geisel, que explodiu no Governo Figueiredo, tendo sido um dos estopins para a crise que fez o Brasil quebrar nesse período tendo que inclusive declarar moratória¹. Até hoje estão abandonadas em galpões de São Paulo, várias locomotivas elétricas desmontadas adquiridas para operação, mas nunca usadas, além de uma infinidade de materiais que simplesmente ninguém sabe o que fazer com eles.

Nessa época, fez parte desse desmonte linhas viáveis operadas pela E.F. Leopoldina, mas extintas sem critério, tendo como base apenas o fato de serem em bitola métrica. Um exemplo disso são linhas da região de Cruzeiro-SP e o Sul de Minas. Moradores da região sabem bem disso e vejam que isso é o que nós da região sudeste conhecemos, mas essas ações infelizmente aconteceram em todo o Brasil.

A estação ferroviária de Cruzeiro-SP, por onde os trens pararam de passar há décadas, poderá ser reformada ainda em 2020, conforme a prefeitura. Fonte: Portal R3

Um massacre que provocou enorme prejuízo às regiões e ao Brasil na totalidade. E, se o que está ruim pode piorar, enraizou-se em toda uma geração de profissionais do setor ferroviário a convicção de que a bitola larga é melhor e que novos projetos devem ser em tal bitola, não importando os custos de construção disso. Nenhum argumento racional, como dito antes, é analisado. Sempre existe o pressuposto de que esse argumento em contrário, quando apresentado, está errado. Afinal, “Bitola larga é melhor”, e pronto. Qualquer argumentação contrária não é levada em consideração ou é ridicularizada.

Antes, o termo usado para isso era “ilusão da verdade”, hoje é “fake news”. Mas desde sempre o objetivo de quem defende esse tipo de coisas nunca foi o de defender a verdade, mas sim o de proteger a mentira. E para quem acha que tudo isso pode ser apenas teoria da conspiração, observe as linhas extintas principalmente nos Estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais: na sua maioria eram da E.F. Leopoldina, Minas Gerais poderia ter uma linha em bitola métrica ligando o estado ao de São Paulo, passando por Pouso Alegre, foi mais uma linha que foi extinta.

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Estação de Vila Inhomirim, atualmente operada pela Supervia. Os trilhos acabam poucos metros à frente, onde a ferrovia subia para Petrópolis e Três Rios até a década de 1960. Foto: Daddo Moreira, em 2012

Observe também as instituições de ex-funcionários mais antigas existentes até hoje: todas mantêm uma identidade baseada em suas ferrovias de origem: E.F.C.B. ou E.F. Leopoldina. Dificilmente usam o nome da RFFSA.

  • Associação Mútua de funcionários da Estrada de Ferro Leopoldina;
  • Associação de Engenheiros da E.F.C.B, atual AENFER, Associação dos Engenheiros Ferroviários;
  • Associação de ex-funcionários da Leopoldina.

E existem muitas outras como esses exemplos.

A integração E.F.C.B. x E.F. Leopoldina nunca foi efetiva.

E respondendo à questão inicial deste texto: peneirar a gema antes de bater a massa para não deixar cheiro é pura lenda urbana. Coloque as claras e as gemas direto na massa e bata. Veja abaixo um vídeo onde é feito um teste.

Desmistificando a lenda de peneirar ou não as gemas Fonte: Canal Bolos Bafônicos

  

¹Moratória: disposição legal que prevê a suspensão dos pagamentos devidos a credores internacionais, quando um país se encontra em circunstâncias excepcionais, como guerra, grande calamidade, crise econômica etc

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Autor

  • Mozart Rosa

    Iniciou sua carreira profissional em 1978 trabalhando com um engenheiro que foi estagiário da RFFSA entre 1965 e 1966, que testemunhou o desmonte da E.F. Cantagalo e diversas histórias da Ferrovia de Petrópolis. Se formou Engenheiro Mecânico pela Faculdade Souza Marques em 1992, foi secretário-geral Trilhos do Rio no mandato 2017-2020 e atualmente ocupa o cargo de redator do site, assessor de contatos corporativos e diretor-técnico.

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