✍️ Mozart Rosa
📅 28/04/2023
🕚 12h00
📷 A maior ponte ferroviária de pedra do mundo, na linha Bohinj que percorre a Eslovênia. Fonte: DragoNika
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Olá, Amigas e Amigos!
Algo extremamente normal é ver, em grupos de discussão, pessoas que desconhecem a história criticando o Brasil pela sua malha ferroviária exígua. Neste artigo, mostraremos os motivos disso, que passa a ser o artigo número 2, complementando os Três Aspectos do artigo número 1 e contextualizando a história com informações sobre o início das ferrovias e por que não podemos comparar nossa situação com a de outros países.
Agradecemos a atenção e desejamos uma excelente leitura!
ARTIGO NÚMERO 2: FERROVIAS BRASILEIRAS, EUROPEIAS, AMERICANAS… PODEMOS COMPARAR? NÃO…
Você conhece os três aspectos que citamos há pouco?
Se não, ficará bem difícil explicar o que aconteceu no passado. Mas além dos três aspectos, é preciso entender um mínimo de história e geografia mundial e do Brasil, para não incorrer no erro muito comum de querer comparar as histórias das ferrovias brasileiras, americanas e europeias. É como querer comparar de forma simples a história macro do Brasil, Estados Unidos e Europa. Quem quiser fazer essa comparação incorrerá em grave erro.
Como já mostrado anteriormente, as ferrovias nasceram na Inglaterra, graças a um concurso e à Revolução Industrial. Esse e outros detalhes são apresentados no artigo abaixo:
Mas outro aspecto importante para a proliferação das ferrovias na Europa nunca é citado e foi extremamente importante para essa proliferação: o conhecimento que o Europeu tinha de sua geografia. A Europa já era conhecida e mapeada pelos europeus há pelo menos 2000 anos. Os romanos foram os primeiros a construir estradas por toda a Europa e mapeá-las, coisa que no Brasil só começa a acontecer de forma tímida a partir de 1500 e de forma efetiva só a partir de 1808, ano em que a família real se mudou para o Brasil. Ou seja, temos uma diferença sobre o conhecimento geográfico da nossa nação em relação às europeias de mais de 1800 anos. Alguém consegue mensurar isso?

O atual Canal de Corinto, na Grécia, foi concluído entre 1881 e 1893, mas começou a ser construído pelo imperador Nero em 67 d.C. Citamos esse canal para mostrar a importância dos romanos na Europa atual.
Ou seja, voltando ao assunto, as comparações são extremamente esdrúxulas, que pessoas que desconhecem isso fazem. Tentamos mostrar isso na postagem abaixo:
A maioria dos que acompanham o setor não leram obras de Cristiano Ottoni e Paulo de Frontin, entre outros, que mostram as dificuldades de construir estradas de ferro no Brasil, pela simples razão de não conhecerem o terreno. Daí que muitas estradas foram construídas com curvas e passando por locais que hoje consideramos desnecessários.
Construir essas ferrovias foi um trabalho hercúleo. Devemos muito a esses homens hoje por muitos esquecidos (lembrem-se da forma como a história é ensinada no Brasil, leiam nosso artigo número 1). Comparar ferrovias do Brasil e da Europa sem considerar isso demonstra enorme desconhecimento sobre o que aconteceu no passado.
O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) foi fundado em 1838. Na Europa, existem instituições equivalentes à nossa que têm mais de 400 anos. Portanto, querer fazer comparações é inviável. Por exemplo: a Royal Geographical Society, uma instituição inglesa, apesar de ter sido fundada em 1830, absorveu outra instituição que foi fundada em 1788.
Sobre as ferrovias americanas, devemos saber o seguinte: nos Estados Unidos, a corrida do ouro em direção ao oeste fez com que o mapeamento geográfico do solo norte-americano fosse feito de forma mais rápida do que o nosso. Consideremos também a inexistência de florestas tropicais como as nossas, extremamente densas, que inviabilizaram e inviabilizam uma maior exploração de locais.

A corrida para o oeste, em busca do ouro, mapeou toda a região, facilitando muito a construção das ferrovias. Isso, aliado ao financiamento privado que sempre existiu e ainda existe nos Estados Unidos, permitiu que, com a conjunção desses fatores, resultasse hoje em uma rede com mais de 200.000 km de ferrovias construídas e em operação, além de uma infinidade de companhias ferroviárias.
É comum em postagens na internet usarem o desenho abaixo:
No Brasil, com a nefasta – e aclamada por alguns – participação do estado na construção e na operação de ferrovias, que começou no governo de Getúlio Vargas, ficamos à mercê do estado para construí-las e operá-las, e isso efetivamente só acabou no governo FHC, com o desmonte da RFFSA e com a extinção do monopólio. Monopólio este que nos legou uma malha próxima a 30.000 km, boa parte hoje inoperante. Lembrem-se que durante 40 anos só tínhamos a RFFSA, essa empresa endeusada por muitos, e que exercia seu monopólio ferozmente. Alguém sabe quantas companhias ferroviárias existiam e existem hoje nos Estados Unidos? A Amtrak é apenas uma delas.

Você sabia que a Pan Am – aquela famosa e extinta companhia aérea – tinha a sua subsidiária de transporte ferroviário? É a Pan Am Railways.

Um fator que atrapalhou muito a proliferação das ferrovias no Brasil foi o monopólio da RFFSA. Alguém lembra quando existia monopólio de linhas telefônicas e o quanto elas custavam? Pois é, ao acabar com o monopólio, além das linhas fixas caírem de preços vertiginosamente, o preço dos celulares e das respectivas linhas também caiu. Hoje, se compra celulares em shopping, escolhe-se a operadora, ou escolhe-se a loja onde comprar, escolhe-se o aparelho, escolhe-se tudo, e todos têm celulares. Isso em 30 anos de quebra do monopólio das telecomunicações. Se isso tivesse acontecido com a RFFSA, certamente a realidade hoje teria sido diferente. Segundo a FGV – Fundação Getúlio Vargas, o Brasil atualmente tem 242 milhões de celulares inteligentes em uso no país, que tem pouco mais de 214 milhões de habitantes, de acordo com o IBGE. A pesquisa mostra que, ao adicionar notebooks e tablets, são ao todo 352 milhões de dispositivos portáteis no Brasil, o equivalente a 1,6 aparelho por pessoa.

Portanto, quando aquele seu amigo intelectual defender o socialismo e as estatais, ou mesmo você, reflita um pouco sobre essas informações. A questão das bitolas também aconteceu nos Estados Unidos, mas lá a solução encontrada foi padronizar tudo em uma bitola só, como na Inglaterra, como é mostrado no livro abaixo.

Para quase tudo se tem um jeito, contudo neste aspecto o tempo passou e hoje isso seria praticamente inviável no Brasil.
INFORMAÇÕES RELEVANTES
Apresentamos abaixo uma série de informações que, por sua considerada relevância, merecem ser destacadas e assinaladas para fixação:
- Informação Histórica Relevante nº 1: A Transiberiana, ferrovia russa construída para integrar a nação russa, foi construída em sua quase totalidade com a mão de obra de prisioneiros. Poderíamos copiar isso aqui?

- Informação Histórica Relevante nº 2: Hoje, ao vermos a transposição ferroviária da Serra das Araras e sua infinidade de curvas, fica a dúvida se aquilo seria necessário e se não teria existido qualquer esquema financeiro escuso para aumentar as curvas e receber por isso. Não, não houve (não podemos afirmar, mas em princípio não houve). Aquela absurda quantidade de curvas foi necessária para poder alcançar Barra do Piraí por adesão direta, sendo considerada uma das maiores obras de engenharia de sua época por ter conseguido isso.

Entendam que na época o domínio tecnológico para a construção de ferrovias era da Inglaterra, e eles, pela incapacidade de construir em alguns trechos por adesão direta e pela inexistência na época do sistema “Fell” ou das cremalheiras, sempre construíam ferrovias em locais com forte declive usando o sistema funicular. Fizeram isso aqui no Brasil no trajeto para Santos via Paranapiacaba.

Isso também se aplica às curvas que transpõem a serra para alcançar Miguel Pereira e que foram construídas por Paulo de Frontin. Portanto devemos respeitar nossos engenheiros do passado e do presente. Nós temos uma história de sucesso, história essa destruída e recontada por quem quer nos fazer parecer um bando de idiotas.
- Informação Histórica Relevante nº 3: A Índia tem uma malha ferroviária muito maior do que a brasileira, e essa malha é administrada pela Indian Railways, considerada a estatal mais incompetente do planeta. Tinha mais de um milhão de funcionários há 10 anos atrás.

Acontece que essa malha ferroviária foi construída pelos ingleses e começou ser estatizada em 1947 pelos Indianos após a sua independência. Os motivos foram os mesmos que levaram Juscelino Kubitschek a criar a RFFSA, e não a independência. Isso será mostrado mais amiúde em nosso texto sobre as Teorias da Conspiração e das Ideias Sem Sentido.
- Informação Histórica Relevante nº 4: Vamos analisar fatos auditáveis e desconsiderar a ideologia. Não queiram comparar as informações prestadas aqui com o que acontece atualmente na China. Lá é um sistema sem paralelo no mundo, não tem comparação. Além disso, seria confiável a estatística divulgada pelo governo chinês? A rede de trens de alta velocidade chinesa, segundo técnicos aqui no Brasil, não se sustenta.

- Informação EXTREMAMENTE Relevante nº 5: Somos uma nação que, apesar de descoberta em 1500, iniciou seu processo efetivo de desenvolvimento e colonização apenas com a chegada da família real em 1808.
- O continente europeu iniciou seu desenvolvimento com a ampliação do Império Romano, há mais de 2000 anos.
- Nos Estados Unidos, como já mostrado, a expansão para o oeste foi responsável pelo povoamento e mapeamento daquela parte do país, e não tivemos isso aqui. O mais próximo que tivemos foi a exploração de ouro em Minas Gerais.
- Somos um país tropical.
- De modo geral, somos muito diferentes de europeus e americanos.
- Querer fazer comparações simples, sem análise de contexto, é forçar muito a barra.
Portanto, importar aleatoriamente soluções que estão funcionando muito bem na Europa e nos Estados Unidos, sem as devidas adaptações e sem os devidos estudos principalmente se dentro desse contexto tiver o aspecto ideológico, levarão essas mesmas soluções ao fracasso.
Obrigado por chegarem até aqui.
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Obrigado pela atenção! Até a próxima!
As opiniões explícitas neste texto podem, ou não, parcialmente ou totalmente, ser a opinião da instituição, sendo de inteira responsabilidade do autor
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